A terapia dupla com dolutegravir funciona bem tanto para tratamento de primeira linha quanto para manutenção
Pedro Cahn na IAS 2019. Foto de Liz Highleyman.
As pessoas que iniciaram tratamento para o VIH pela primeira vez com uma combinação de dois fármacos com dolutegravir e lamivudina tiveram a mesma probabilidade de ter uma carga viral indetetável após 96 semanas do que as pessoas numa combinação padrão de três medicamentos. A combinação de dois medicamentos também manteve a supressão viral naqueles que mudaram de um regime padrão.
Estes factos dos estudos GEMINI e TANGO foram apresentados na 10ª Conferência sobre Ciência do VIH da Sociedade Internacional sobre SIDA (IAS 2019) durante a semana passada na Cidade do México.
O tratamento para o VIH é um compromisso vitalício e a redução do número de medicamentos que as pessoas precisam tomar pode reduzir os efeitos secundários e os custos. Mas a terapia antirretroviral com dois fármacos requer medicamentos suficientemente fortes para manter a carga viral totalmente suprimida e prevenir o desenvolvimento de resistência aos medicamentos.
Os estudos GEMINI 1 e 2, a decorrer, são ensaios clínicos de fase III que envolveram 1433 pessoas na Europa, nas Américas, na Ásia, na Austrália, na Rússia e na África do Sul, que iniciaram o tratamento para o VIH pela primeira vez. Os participantes foram aleatoriamente escolhidos para receber ou dolutegravir mais lamivudina - os antirretrovirais na formulação Dovato - ou dolutegravir mais tenofovir disoproxil fumarato (TDF) e emtricitabina.
O Dr. Pedro Cahn apresentou resultados de 96 semanas, destacando 86,0% no grupo dolutegravir / lamivudina e 89,5% no grupo dolutegravir / TDF / emtricitabina com carga viral indetetável, demostrando que o regime de dois fármacos não foi inferior regime de três.
Os resultados do estudo TANGO também foram apresentados. Este é um estudo de fase III que compara a segurança e a eficácia da mudança para a coformulação de dose fixa de dolutegravir / lamivudina versus permanecer num regime de três ou quatro medicamentos contendo tenofovir alafenamida fumarato (TAF), a versão mais recente do tenofovir.
A TANGO recrutou 741 participantes na Europa, América do Norte, Austrália e Japão. Os participantes foram aleatoriamente escolhidos para mudar para dolutegravir / lamivudina ou permanecer no seu regime atual contendo TAF. Às 48 semanas, 93,2% das pessoas que mudaram para o dolutegravir / lamivudina e 93,0% das que permaneceram no regime de TAF mantiveram a supressão viral, atingindo novamente aos critérios de não inferioridade.
Pode a integração da prevenção do VIH nos serviços contracetivos reduzir as infeções entre as mulheres africanas?
Jacque Wambui do AfroCAB na IAS 2019. Foto de Roger Pebody
No mês passado, os resultados do estudo de referência ECHO (Evidências de Opções Contracetivas e Resultados em VIH) foram publicados, demonstrando que os contracetivos hormonais injetáveis não aumentam o risco de as mulheres adquirirem VIH. O ECHO não encontrou diferenças significativas na taxa de infeções por VIH entre mulheres escolhidas aleatoriamente para usar um dos três métodos contracetivos de ação prolongada: DMPA injetável (depósito de acetato de medroxiprogesterona, também conhecido como Depo Provera); o dispositivo intrauterino de cobre (DIU); ou implante de levonorgestrel.
Apesar das notícias tranquilizadoras sobre a contraceção, o estudo revelou alta incidência de VIH entre os participantes, apesar dos serviços de prevenção prestados. Na IAS 2019, investigadores, responsáveis por políticas e ativistas discutiram as informações do estudo e como melhor servir as mulheres jovens na África subsaariana.
"Os resultados do ECHO não são 'boas notícias'", disse o ativista Jacque Wambui, do AfroCAB. “As mulheres deste estudo foram recrutadas e participaram porque queriam contraceção e eram sexualmente ativas. Elas não tinham os "fatores de risco" que ouvimos falar em tantos outros ensaios de prevenção do VIH. "
Ativistas e cientistas defendem que uma lição fundamental do ECHO é que as mulheres precisam de apoio nos mesmos locais para prevenir gravidezes e VIH, dos mesmos prestadores de cuidados de saúde. As mulheres que não se enquadram em "grupos de alto risco" têm maior probabilidade de frequentar os serviços de saúde reprodutiva do que os serviços de prevenção de VIH. No entanto, sem financiamento específico a apoiar, implementar a integração será um desafio em serviços de saúde sobrecarregados e com escassez de pessoal.
Início da PrEP no próprio dia viável e segura na América Latina
Valdiléa Veloso do estudo ImPrEP na IAS 2019. Foto de Roger Pebody.
Populações marginalizadas na região, como homens que fazem sexo com homens e mulheres transexuais, enfrentam barreiras para aceder a ferramentas de prevenção do VIH, como a PrEP.
O estudo ImPrEP investiga a iniciação e a adesão da PrEP no próprio dia, envolvendo homens que fazem sexo com homens e mulheres transexuais no Brasil (3466 participantes), Peru (1149) e México (739).
Os resultados demostraram que a iniciação da PrEP no próprio dia era viável e segura, com 80% a comparecer a pelo menos duas visitas de acompanhamento e 97% a tomar pelo menos 16 dias de medicação no último mês. No entanto, o compromisso foi menor nos participantes mais jovens e nas mulheres trans.
Outro projeto de demonstração de PrEP no Brasil, PrEParadas, foca-se em mulheres transgénero. A implementação de programas de implantação da PrEP para mulheres transgénero tem sido particularmente desafiadora na América Latina devido a barreiras estruturais, incluindo a violência contra mulheres trans. Também tem havido preocupações sobre as interações entre a PrEP e as hormonas, bem como em providenciar a PrEP em ambientes afirmativos de género por profissionais de saúde treinados.
Em PrEParadas, 116 de 130 mulheres recrutadas voltaram na quarta semana e mais de 60% tinham tomado entre quatro e sete doses de PrEP por semana. Os fatores associados à má adesão à PrEP às 12 semanas incluíram alojamento instável e uso de estimulantes. O estudo está a decorrer.
Outras investigações apresentadas na IAS 2019 debruçaram-se sobre o conhecimento, intenção e aceitação da PrEP numa amostra on-line de homens que fazem sexo com homens no México. Uma grande percentagem de homens (76%) ouviu falar sobre a PrEP e mais de um terço pretendia usar a PrEP nos próximos seis meses, mas menos de 4% relataram o uso da PrEP.
A terapia de resgate de Fostemsavir continua a correr bem às 96 semanas
Créditos da imagem: ViiV Healthcare
O estudo BRIGHTE é um estudo a decorrer de fase III que avalia o fostemsavir em pessoas com VIH multirresistente que não respondem a um regime antirretroviral eficaz usando os medicamentos disponíveis.
A parte aleatória do estudo incluiu 272 participantes resistentes ao tratamento com vírus não suprimido. Todos os participantes tinham que ser sensíveis a uma ou duas classes restantes de medicamentos antirretrovirais sendo que, a pelo menos um dos fármacos aprovados, a sensibilidade deveria ser total; o dolutegravir ainda era totalmente eficaz para cerca de 65% dos participantes. Estes foram distribuídos para tomar 600mg de fostemsavir duas vezes ao dia ou um placebo, juntamente com o seu regime em falha por oito dias. Depois disso, todos receberam fostemsavir e um regime de base otimizado. Adicionalmente, 99 indivíduos que não tinham nenhum medicamento aprovado ao qual fossem sensíveis foram incluídos numa coorte de uso compassivo não randomizado.
No ano passado, os resultados das 48 semanas do estudo demostraram que 54% dos participantes que foram randomizados para receber fostemsavir e 38% daqueles na coorte não randomizada alcançaram supressão viral (<40 cópias / ml). Os resultados das 96 semanas apresentados na IAS 2019 mostraram que a proporção de pessoas com supressão viral no grupo randomizado subiu para 60% e no grupo não-randomizado a taxa de supressão viral permaneceu estável em 37%
Os participantes do estudo, muitos dos quais tinham imunossupressão avançada, também experimentaram ganhos substanciais nas células CD4. O tratamento continuou a ser seguro e bem tolerado.
13% dos europeus com VIH que se curaram da hepatite C reinfectam-se
Sarah Amele na IAS 2019. Foto de Liz Highleyman.
Quase todos, independentemente do estatuto para o VIH, podem facilmente ser curados da hepatite C com antivirais de ação direta. No entanto, a infeção inicial não confere imunidade e é possível reinfectar-se se ocorrer um comportamento de risco contínuo.
A análise incluiu 585 pessoas que alcançaram uma resposta virológica sustentada após a conclusão do tratamento da hepatite C (considerada uma cura). No total, 78 pessoas, ou 13,3%, foram reinfectadas no período de dois anos.
Indivíduos da Europa Ocidental e Oriental, aqueles com uma contagem de CD4 acima de 500 células / mm3 e aqueles com fibrose hepática avançada ou cirrose tinham maior probabilidade de reinfeção.
Sarah Amele, que apresentou o estudo, disse que estes resultados demonstram a necessidade de educação e serviços de redução de danos se quisermos atingir a meta de eliminar a hepatite C como um problema de saúde pública.
Anel vaginal de dapivirina eficaz e aceitável para uso prolongado
Jared Baeten na IAS 2019. Foto de Liz Highleyman.
O anel é usado continuamente por um mês antes de ser substituído e a dapivirina difunde- se ao longo do tempo. Num estudo randomizado anterior, mais de 2600 mulheres seronegativas em 14 locais no Malawi, África do Sul, Uganda e Zimbábue foram aleatoriamente escolhidas para usar o anel de dapivirina ou um anel de placebo. A análise dos resultados mostrou que a eficácia estava associada à idade, provavelmente devido a diferentes níveis de adesão. Apesar do risco de contrair VIH ter sido reduzido em apenas 27% no total, as mulheres que usaram o anel consistentemente tiveram um risco 65% menor de se infetarem com VIH.
Depois da conclusão do estudo randomizado, os participantes foram convidados a participar num estudo de extensão aberto, no qual todas as mulheres receberam o anel de dapivirina e não houve grupo controlo. O estudo HOPE envolveu 1456 mulheres e 73% das mulheres que permaneceram elegíveis usaram o anel durante os 12 meses do estudo. Um total de 35 mulheres infetou-se com VIH durante o acompanhamento. Após o ajuste para fatores como idade e doenças sexualmente transmissíveis, os investigadores estimaram que o anel reduziu a incidência do VIH em 39%.
É o Descovy uma solução para as pessoas com dificuldade de adesão à PrEP?
Christoph Spinner na IAS 2019. Foto de Liz Highleyman.
É possível que a profilaxia pré-exposição (PrEP), através do uso tenofovir alafenamida fumarato (TAF) e emtricitabina (combinada em Descovy), possa ter um papel em fornecer um regime de PrEP mais "benévolo" para pessoas com adesão sub-ótima à PrEP, ou que a tomam intermitentemente, do que o regime padrão de tenofovir disoproxil fumarato (TDF) e emtricitabina (presentes na combinação Truvada, embora cada vez mais disponível como uma formulação genérica). Esta foi a conclusão de uma análise post-hoc dos resultados do estudo DISCOVER, apresentado na IAS 2019.
Os resultados do DISCOVER foram anunciados no início deste ano, e seu principal resultado foi que o TAF e a emtricitabina não são inferiores ao TDF e à emtricitabina quando usados como PrEP.
De fato, menos pessoas no grupo que tomam TAF se infetaram com VIH e, embora o resultado não seja conclusivo, os investigadores tentaram perceber a razão para isso.
Não encontraram nenhuma diferença entre os participantes que tomaram os dois regimes em termos de comportamento sexual, infeções sexualmente transmissíveis ou adesão. No entanto, quando se focaram nas pessoas que se infetaram com VIH, descobriram que todos tinham baixa adesão ao seu regime de PrEP. Porém, das pessoas que se infetaram, ninguém estava a tomar mais de dois comprimidos por semana, no grupo do TAF, e algumas pessoas, no grupo do TDF, estavam a tomar entre dois a quatro comprimidos por semana.
Isso pode ocorrer porque o TAF atinge as células T mais rapidamente que o TDF e o TAF mantém-se nas células mais tempo - o que significa que as probabilidades de infeção aumentam mais rapidamente nas pessoas que falham na adesão ao TDF do que nas pessoas que fazem o mesmo com o TAF.
No entanto, algumas pessoas questionaram se as diferenças entre os dois braços do estudo eram grandes o suficiente para justificar o custo extra de usar Descovy como PrEP.
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Análise científica da Clinical Care Options
Clinical Care Options é o provedor oficial de análise científica on-line da IAS 2019 por meio de resumos, slides para download, webinars rápidos de especialistas e comentários ClinicalThought.